Leitor raiz da DozeNews nem se preocupa em perder o final de semana checando as novidades dos congresso internacionais: ele já sabe que às 12:08h da segunda-feira terá todas as atualizações 😉.
Aqui estamos nós, mais uma vez, com os principais artigos apresentados no congresso do American College of Cardiology 2024 (ACC 24, para os íntimos).
O evento, que começou sábado (dia 06/04), ainda continua hoje com a publicação de interessantes artigos.
Fique de olho nas nossas redes sociais, pois atualizaremos vocês dos late-breakers de hoje!
Dia 1
Quem acompanhou o congresso na íntegra, começou o primeiro dia com uma sensação de desânimo.
De cara, os 3 primeiros artigos apresentados naquela manhã em Atlanta (e que alguns consideravam alguns dos principais de todo o evento) tiveram resultados negativos.
Mas calma lá, não é porque um trial é negativo que ele não possa trazer valiosas lições. Vamos entender.
😮💨 RELIEVE-HF: criar um shunt interatrial não reduziu eventos e sintomas na insuficiência cardíaca (IC).
É isso mesmo que você leu rs! A ideia aqui era criar uma comunicação interatrial no forame oval por meio do dispositivo V-Wave, para aliviar sintomas na IC.
508 pacientes em tratamento otimizado para IC e que mantinham-se em NYHA CF II-IV (a FEVE média foi de 45%, o NT-Pro-BNP era marcadamente elevado e a maioria estava em CF NYHA III - ou seja, pacientes graves) foram randomizados para implante do V-Wave x sham procedure.
Apesar de os primeiros 30 dias terem demonstrado segurança da prótese, após 2 anos de seguimento veio a decepção: não houve diferença entre os grupos para o desfecho composto por morte, parâmetros de evolução da IC e sintomas.
Em uma subanálise dividindo os grupos quanto à FEVE um sopro de esperança (shunt, sopro, entendeu? rs) : aqueles com FEVE ≤ 40% apresentaram amplo benefício clínico com o implante da prótese.
Será que essa subanálise será suficiente para estabelecer o uso dessa estratégia na IC? Cenas dos próximos capítulos…
😵EMPACT-MI: será que presenciamos a primeira derrota dos inibidores da SGLT2?
O estudo teve como objetivo avaliar se a prescrição da empagliflozina nos primeiros dias pós-IAM seria capaz de reduzir eventos cardiovasculares?
Foram 6522 pacientes hospitalizados por IAM com fatores de risco para evolução com IC sintomática, randomizados para receber empagliflozina 10 mg/dia dentro dos primeiros dias do evento vs placebo.
E a derrota veio: após um seguimento médio de 17,9 meses não houve redução do desfecho composto por hospitalização por IC e morte por qualquer causa.
💉AEGIS II: a infusão semanal de derivado da apolipoproteína A pós-IAM é capaz de reduzir eventos?
Entenda a ideia: o objetivo da infusão da apolipoproteína A era aumentar a capacidade de efluxo do colesterol por meio do aumento do HDL.
Para isso, randomizaram 18.219 adultos pós-IAM para receber infusão semanal por 4 semanas da CSL112 vs placebo.
Falhooou… Após 90 dias, não houve diferença entre os grupos para o desfecho composto por IAM, AVC e morte cardiovascular.
Análises adicionais, no entanto, mostraram certo benefício em pacientes com LDL > 100 mg/dL.
✌🏼VICTORIAN INITIATE: o poder do Inclisiran.
O estudo objetivou avaliar a redução do LDL com o uso do Inclisiran (um siRNA- small interfering RNA) em pacientes com doença cardiovascular estabelecida e LDL ≥ 70 mg/dl apesar do uso em dose máxima das estatinas ou intolerência.
Foi randomizado e open label (inclisiran em 2 infusões/ano vs terapia usual).
Após 330 dias, o Inclisiran reduziu em 60% os valores do LDL, em comparação a apenas 7% do tratamento usual, sem diferença com a descontinuação da estatina.
Essa medicação promete, hein?
🫀 STEP-HFpEF DM: após os benefícios demonstrados no STEP-HFpEF em 2023, foi a vez de adicionar os diabéticos na história.
Foram randomizados 616 pacientes com IC FEP (FEVE ≥ 45%), IMC ≥ 30 kg/m² e DM2 para receber Semaglutida 2,4 mg/semana (Wegovy) vs placebo.
Surpreendendo um total de 0 pessoas… Após o seguimento de 52 semanas, o agonista da GLP1 foi capaz de reduzir o desfecho primário composto por melhoria da qualidade de vida, perda ponderal e melhora da capacidade funcional.
Convenhamos, sem grandes novidades por aqui…
Menção honrosa, ainda, ao CRESCENT Trial, que demonstrou não inferioridade de dispositivos de avanço mandibular vs o CPAP na redução da PA em paciente hipertensos com apneia do sono e alto risco cardiovascular.
Dia 2
Vamos começar pelo mais impactante, na visão da Doze.
Sabe aquele betabloqueador que você prescreve por 01 ano após IAM? Pois então…
💊 REDUCE-AMI, publicado no NEJM concomitantemente e com um excelente editorial, questionou se, 20 anos depois de estudos como CAPRICORN, ainda fazia sentido prescrever betabloqueador em pacientes que sofreram IAM e sem disfunção ventricular.
Randomizou 5.020 pacientes com IAM, que foram para cinecoronariografia e com FE > 50%, entre receber metoprolol ou bisoprolol versus nenhuma medicação adicional, com um seguimento de 3,5 anos.
Não houve diferença no desfecho composto de mortalidade ou IAM (7,9% vs 8,3%, HR 0.96, IC 0.79-1.16, p = 0.64). Também não reduziu nenhum dos desfechos secundários avaliados.
Provavelmente mudará diretriz. Uma medicação a menos na famosa receitinha de bolo pós IAM feita por aí.
Além dele, também tivemos novidades interessantes.
🫀 Danger-shock Trial, também publicado no NEJM, randomizou 360 pacientes com IAM com supra de ST e choque cardiogênico, entre receber assistência circulatória com dispositivo de fluxo microxial transvalvar (Impella CP) versus tratamento habitual, durante o seguimento de 180 dias.
Mortalidade geral 45.8% vs 58.5% (HR 0.74, IC 0.55-0.99, p = 0.04).
Desfecho de segurança e complicação do dispositivo 24% vs 6.2%, inclusive necessidade de TSR 41,9 vs 26,7%;
Finalmente uma vitória dos dispositivos de assistência ventricular no contexto de pacientes de altíssima gravidade (IAM + choque cardiogênico)? Sem dúvidas, um benefício importante com um NNT expressivo, de 8!
🩸 Ultimate DAPT trial: não deixe de ler esse. Sim eu sei que você esta cansado de novos esquemas de DAPT, inclusive fizemos uma PRIME para te deixar por dentro do assunto. Mas esse estudo ajuda a consolidar a virada de chave que vem por aí com os novos iP2Y12.
Os autores randomizaram 3.500 pacientes com IAM + intervenção percutânea entre DAPT por 1 mês seguido de monoterapia com Ticagrelor versus DAPT por 12 meses.
Desfecho primário de redução de sangramento (BARC ≥ 2) 2,1% vs 4,6% (HR 0.46, IC 0.3-0.66, p < 0.0001)
Desfecho de segurança (composto de MACE): 3,6 vs 3,7%, p < 0.0001 para não inferioridade
E para os hemodinamicistas, um estudo de extrema importância:
⛓️ Smart Trial - TAVI autoexpansível supranular versus balão-expansível em pacientes com anel aórtico pequeno.
716 pacientes com EAo grave e área valvar ≤ 0,43 cm² foram randomizados entre as duas estratégias
A TAVI autoexpansível foi não inferior em desfechos clínicos e superior em um desfecho composto de disfunção da prótese em 12 meses:
Mortalidade, AVC ou rehospitalização por IC (nao inferioridade): 9.4% vs 10.6% (p < 0.001)
Disfunção de prótese (superioridade) 9.4% vs 41.6%
Foram apresentados também 2 artigos com uma pegada mais incomum dentro da cardiologia:
🙏🏼 FEEL Trial: estudo brasileiro 🇧🇷 que randomizou 100 pacientes com HAS estágios 1 e 2 para receber um auxílio de terapia espiritual.
Isso mesmo, os pacientes recebiam uma intervenção espiritual (doze semanas de mensagens diárias por smartphone, projetadas para cultivar a espiritualidade e promover a reflexão) associada à terapia usual vs terapia para HAS isolada.
Após um seguimento curto de 12 semanas, observaram uma redução significativa (em média de 7 mmHg) da PAS com a intervenção espiritual.
Parece pouco, mas é um dos maiores benefícios registrados com terapias não medicamentosas na HAS. Sem dúvidas ainda exige estudos com n maiores e seguimento mais prolongado para avaliar a manutenção do benefício, mas já é um início!
😴 B-FREE Trial: A restrição da administração de benzodiazepínicos durante a cirurgia cardíaca reduz a incidência de delirium?
Foram 9941 pacientes em programação de cirurgia cardíaca randomizados para restrição do uso de benzodiazepínicos no perioperatório vs uso liberal.
Não houve diferença para o desfecho primário de redução da incidência de delirium dentro das primeiras 72 horas de pós-operatório.
Em uma subanálise que excluiu pacientes que receberam benzodiazepínicos nas 24 horas anteriores à cirurgia, houve uma redução modesta no delirium com o uso restritivo de benzodiazepínicos.
🩸Nessa mesma tarde, ainda foi apresentada uma subanálise do estudo MINT, publicado em novembro no NEJM, que já havia demonstrado não haver benefício da transfusão liberal em pacientes com IAM e anemia (Hb < 10 g/dL).
Nela, não houve diferença mesmo quando avaliados IAM tipo 1 e 2 separadamente, apesar de uma tendência a benefício da transfusão liberal no IAM.
Outros trials publicados no dia:
🏃🏻♀️ BE ACTIVE: gamificação, incentivos financeiros e a associação de ambos aumentaram a adesão à meta de número de passos diários.
💉 KARDIA-2: Zilebesiran, um inibidor da síntese hepática de angiotensinogênio, é eficaz e segura no controle da hipertensão (estudo de fase 2). A medicação é uma injeçãop subcutânea e teve seu efeito mantido até o sexto mês!
🧈 BRIDGE-TIMI 73a Trial: estudo de fase 2 com Olezarsen, um inibidor de oligonucleotídeos antisenso da produção de apoC-II reduziu TGL em cerca de 50%.
🧈 LIBerate-HR: Lerodalcibep (um inibidor do PCSK9) reduziu 56% LDL em pacientes com hipercol familiar fora da meta, em uma média de 60,6 mg/dL. Também reduziu ApoB, colesterol nao HDL e Lp(a) - em 33%.
🧈 SHASTA-2: Plozasiran também reduziu TGL significativamente, em estudo de fase 2.
⛓ TACT2 trial: infusão de quelantes de chumbo e cádmio (famoso EDTA) não reduziu desfechos cardiovasculares.
🏈 HUDDLE trial: o namorado de Taylor Swift precisa se cuidar! Alta prevalência de HAS em ex-jogadores da NFL.
Vem aí… (Dia 3)
Alguns estudos já publicados na manhã de hoje e o que ainda está por vir!
PREVENT Trial - demonstrou benefício no tratamento percutâneo de lesões coronárias sem restrição de fluxo ao FFR mas com sinais de vulnerabilidade na imagem intravascular (!)
ARISE-HF - uso de inibidor seletivo da da aldose redutase (AT-001) não demonstrou diferença significativa em relação ao placebo na variação do VO2 pico em pacientes com cardiopatia diabética.
IMPROVE – HCM - nova medicação para a cardiomiopatia hipertrófica não-obstrutiva (ninerafaxstat) foi segura e eficaz na melhora de sintomas.
DEPOSITION - o uso de ácido tranexâmico tópico em pacientes submetidos a cirurgia cardíaca não reduziu o risco de convulsões e aumento a necessidade de transfusões sanguíneas quando comparado ao ácido tranexâmico EV.
PROACT - o uso do Enalapril não trouxe benfícios significativos na prevenção de cardiotoxicidade em pacientes com câncer de mama e linfoma não Hodgkin sob quimioterapia à base de antraciclina?
Logo mais ainda devem ser lançados:
ORBITA-COSMIC - dispositivo em forma de ampulheta que cria uma estenose artificial no seio coronariano é eficaz em pacientes com doença coronariana de difícil controle?
DEDICATE-DZHK6 - resultados do seguimento de um ano comparando a cirurgia vs TAVI no tratamento da estenose aórtica de pacientes com risco cirúrgico baixo a moderado?
IVUS-ACS - a intervenção percutânea guiada por imagem intravascular leva a melhores resultados em pacientes com síndrome coronariana aguda?
Próxima semana voltamos a nossa programação habitual de DozeNews… Até lá!
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