Estrelas novas, palcos conhecidos
Obicetrapib na dislipidemia, TAVI em VAB, angioTC na IC… Novas terapias para antigos problemas
Nova estrela da Broadway
Ensaio Clínico Randomizado (NEJM)
🎭 BROADWAY em cartaz:
Obicetrapib entra em cena como novo coadjuvante da prevenção cardiovascular.
Publicada no New England Journal of Medicine, a aguardada análise do estudo BROADWAY reacende as expectativas em torno dos inibidores da CETP, uma classe de fármacos marcada por promessas e tropeços.
⭐️ A estrela da vez? O obicetrapib, molécula seletiva, oral, hidrofílica — e aparentemente promissora.
O trial incluiu 2.530 pacientes com alto risco cardiovascular (DAC estabelecida ou hipercolesterolemia familiar heterozigótica), todos em uso da terapia hipolipemiante máxima tolerada. O desfecho primário foi a variação percentual do LDL-c em 84 dias.
O resultado foi de aplaudir de pé:
Redução média de 29,9% no LDL-c com obicetrapib;
51% dos pacientes alcançaram LDL-c < 55 mg/dL;
Reduções também em: apoB (−18,9%), não-HDL (−29,4%), TG (−7,8%) e Lp(a) (−33,5%);
Perfil de segurança comparável ao placebo, sem aumento de eventos glicêmicos ou renais.
Olho nos coadjuvantes: todos os pacientes já estavam em uso de estatinas, ezetimiba e/ou PCSK9. Ou seja, o obicetrapib mostrou eficácia mesmo quando o arsenal terapêutico já parecia completo.
E por que agora pode dar certo?
Em um cenário que até então mais parecia uma ópera trágica, na qual os outros inibidores da CETP fracassaram em segurança ou eficácia clínica (torcetrapib, evacetrapib, dalcetrapib...), o obicetrapib demonstrou excelente tolerabilidade, efeito potente no LDL e um perfil farmacológico mais favorável, sem os efeitos adversos de classe.
Será que dessa vez o enredo será diferente? O final ainda não chegou, e temos todo um segundo ato pela frente: o BROADWAY não avaliou desfechos clínicos, mas o ensaio cardiovascular de hard outcomes (NCT05202509) já está em andamento.
No palco da prevenção cardiovascular, o obicetrapib pode ser mais do que um figurante. Mas, o espetáculo só se torna inesquecível se sustentar o impacto até o final. Luzes acesas, cortina aberta... vamos acompanhar os próximos atos.
IC nova, angioTC nela
Coorte (European Heart Journal)
💬 Vamos revisar um tópico aqui rapidinho?
Você está diante de um paciente recém-diagnosticado com insuficiência cardíaca (IC) e precisa investigar a etiologia. O seu arsenal diagnóstico inclui opções como a ressonância magnética para avaliação de cardiomiopatias, e o bom e velho cateterismo cardíaco, ainda recomendado para descartar doença isquêmica em pacientes com alto risco.
Afinal, a cardiopatia isquêmica continua sendo a principal causa de IC — e identificar essa origem muda tudo: da escolha dos medicamentos até a indicação de revascularização ou CDI.
E é aí que entra a angiotomografia coronária (angioTC), que vem ganhando espaço como uma alternativa menos invasiva, rápida e precisa.
Foi justamente esse o foco do estudo publicado no EHJ Cardiovascular Imaging, que avaliou mais de 3.300 pacientes com IC de início recente submetidos à angioTC como primeira abordagem para investigação de doença arterial coronariana (DAC).
Os achados são bem animadores:
Em pacientes com escore de cálcio coronariano (EC) zero, apenas 2,8% tinham estenose ≥50% na angioTC — e apenas 1,2% confirmaram DAC obstrutiva no cateterismo;
Já nos pacientes com EC ≥ 1000, 71,7% tinham estenose ≥50% e quase metade (47,2%) precisaram de revascularização;
No total, a angioTC excluiu DAC obstrutiva em mais de 83% dos casos com exames completos — evitando procedimentos invasivos desnecessários.
Eu já fazia, você já fazia e até a agência nacional de saúde suplementar (ANS) já recomenda a realização da angioTC na investigação etiológica da IC.
O estudo vem para comprovar de uma vez que em pacientes com IC estável e risco baixo a intermediário para DAC, a angioTC é uma estratégia segura, eficaz e poupadora de cateterismos.
Fica a provocação: será que não está na hora de rever o papel da angioTC nas diretrizes, que ainda priorizam o cateterismo como classe I?

TAVI, aprecie com moderação
Artigo de Revisão (European Heart Journal)
Não adianta ligar o piloto automático e indicar TAVI para todo paciente com estenose aórtica severa. Ainda há muitas lacunas, especialmente quando o assunto é válvula aórtica bicúspide (VAB).
Historicamente, pacientes com VAB foram excluídos da maioria dos grandes estudos de TAVI. Mas, com a evolução das técnicas, dos dispositivos e o aumento da experiência dos centros, muitos desses pacientes vêm obtendo bons resultados com a TAVI — o que levantou a questão: será que os desfechos são equivalentes aos dos pacientes com válvula tricúspide? E mais: são comparáveis à cirurgia (SAVR)?
O artigo recém-publicado no EHJ faz uma revisão de peso sobre o estado da arte da TAVI em VAB e traz pontos fundamentais.
1. Por que a VAB é desafiadora?
Calcificação irregular e exuberante que dificulta o preparo do anel e pode aumentar complicações.
Projeções angiográficas difíceis em VAB tipo Sievers 0 (sem rafe), que tornam o planejamento e a implantação da válvula mais complexos.
Dilatação da aorta ascendente, que atrapalha a navegação e posicionamento do dispositivo.
2. Evidências atuais
TAVI em VAB x TAVI em tricúspide: mortalidade semelhante, mas maior risco de AVC isquêmico precoce (OR 1.38; IC95% 1.09–1.77).
TAVI em VAB x Cirurgia (SAVR): risco de morte semelhante no 1º ano, mas estudos sugerem possível aumento da mortalidade com TAVI entre 10 e 13 meses (HR 1.7; IC95% 1.11–2.61).
Estudo NOTION 2 (subanálise): AVCi em 6,1% no grupo TAVI VAB vs 0% na cirurgia; morte em 4,1% vs 2%, respectivamente.
3. O que fazer na prática?
A VAB exige planejamento minucioso. A escolha entre TAVI ou cirurgia deve ser feita com avaliação individualizada, levando em conta:
Tipo anatômico da válvula (Sievers 0, 1 ou 2);
Presença de dilatação aórtica significativa;
Carga de cálcio e presença de rafe;
Risco cirúrgico e expectativa de vida.
O uso de técnicas avançadas de imagem (como angiotomografia com reconstruções 3D), a escolha adequada do tipo de válvula (balão-expansível ou autoexpansível) e, se necessário, dispositivos de proteção cerebral podem ajudar a mitigar os riscos — mas não eliminam os desafios.
Por isso, quando o eco mostrar uma bicúspide, nada de piloto automático: convoque o Heart Team, analise a anatomia com calma e escolha o caminho com mais segurança.
Energético e FA
Caiu na Mídia
Você provavelmente viu nas últimas semanas a repercussão sobre a internação do ator e ex-BBB Rafael Zulu, que desenvolveu uma fibrilação atrial aguda após o consumo excessivo de energéticos.
Em entrevista ao programa Sem Censura, ele compartilhou um relato sincero sobre o episódio — que reacende uma discussão importante (e pouco debatida) na prática clínica: o risco de arritmias associadas ao uso abusivo de bebidas energéticas.
📌 Ainda que a incidência absoluta seja baixa, o consumo agudo e em altas doses de energéticos já foi associado, em diversos relatos clínicos, a episódios de fibrilação atrial paroxística, principalmente em adultos jovens previamente saudáveis.
A combinação de altas doses de cafeína com outros estimulantes como taurina e guaraná, somada a fatores comuns como privação de sono, estresse, consumo de álcool ou esforço físico, pode desencadear arritmias supraventriculares.
Os mecanismos propostos envolvem:
Hiperestimulação adrenérgica;
Sobrecarga de cálcio intracelular;
Alterações eletrofisiológicas que reduzem o limiar para arritmias.
Apesar de não ser um fator de risco tradicional, o uso abusivo de energéticos merece atenção — e deve ser incluído na anamnese cardiovascular, principalmente em pacientes jovens com arritmias de início recente.
Imagem da semana
Uma assustadora aorta em porcelana vista na cineangiocoronariografia, associada à oclusão de tronco braquiocefálico.
Fique por dentro
🦙 Lepodisiran reduziu em até 94% os níveis de lipoproteína(a), com efeito prolongado por até 1 ano. No estudo ALPACA, 320 participantes com níveis elevados de lipoproteína(a) receberam doses únicas ou repetidas do RNA interferente lepodisiran. A dose de 400 mg promoveu uma redução média de 93,9% nos níveis séricos entre os dias 60 e 180, com efeito sustentado em até 360 dias.
🫀 Quanto maior a isquemia no ecocardiograma com estresse, maior o benefício do stent em pacientes com angina estável. Na análise secundária do estudo ORBITA-2, a gravidade da isquemia detectada por ecocardiograma com dobutamina (DSE) foi fortemente associada à melhora dos sintomas de angina e da qualidade de vida após a angioplastia, mesmo quando comparada ao placebo.
👴🏼 Encontramos a fórmula da longevidade? Em análise do estudo REGARDS que acompanhou mais de 11 mil adultos nos EUA por 14 anos, participantes com escore alto na métrica Life’s Essential 8 (LE8) — que avalia hábitos de vida e fatores como sono, dieta, colesterol e tabagismo — apresentaram riscos significativamente menores de mortalidade por causas cardiovasculares, câncer e outras doenças.
💊 Obicetrapib + Ezetimibe: estudo fase 3 com doses fixas sugerem benefício do uso de pílula combinada para redução do LDLc em pacientes com alto risco cardiovascular ou hipercolesterolemia familiar heterozigótica.
🌎 FA nas Américas: artigo de revisão do The Lancet demonstra o panorama e as diferenças regionais além das dificuldades no diagnóstico e tratamento da fibrilação atrial nas Américas.
💉 Mamãe sempre alertou: fique longe de drogas ilícitas. Não bastassem as mães do mundo todo, a ciência comprova que o uso de cocaína e metanfetamina está associado a arritmias ventriculares e morte! Alertar é nosso dever!
💥 Como tratar a doença metabólica e suas complicações? Esta é uma pergunta que você faz todo dia no seu consultório, correto? Pois bem, a sociedade europeia de ateroesclerose publicou no EHJ um consenso de como fazer isso de uma maneira padronizada e com respaldo científico.