Intolerância à estatina: do fake ao fato
O sintoma é realmente da estatina?
Autor: Diandro Mota (cardiologista e ecocardiografista pelo Dante Pazzanese)
Edição: Mateus Prata e Maria Júlia Souto
Poucos assuntos na cardiologia são tão polêmicos quanto o uso de estatina – ainda mais na era das mídias sociais.
O maior inimigo do cardiologista neste cenário parece ser o volume gigantesco de informações deturpadas nos diferentes meios de comunicação, com narrativas criativas que os levam ao lado sombrio da força.
O problema é tão relevante que, em 2016, grandes nomes da cardiologia mundial uniram forças e publicaram uma bela revisão no The Lancet sobre a interpretação das evidências sobre a eficácia e segurança da terapia com estatinas.
Nós, da Doze, sugerimos fortemente a leitura desse artigo para que você tenha todas as informações necessárias na hora de debater falácias com seus pacientes e familiares que possam ter sido doutrinados contra o uso de estatinas.
Afinal, quem não quer ter como aliado no combate a fake news nomes de peso, como Rory Collins e Salim Yusuf? Eles estão entre os autores dessa revisão.
As estatinas seguem como o padrão-ouro para o controle da dislipidemia em pacientes com risco cardiovascular elevado. No entanto, as taxas de descontinuação de estatinas são altas, mesmo entre pacientes com doença arterial coronária (DAC), e chegam a mais de 50% após 1 ano!
Grande parte das interrupções ocorrem por sintomas que poderiam ser encarados de forma mais assertiva para exclusão do diagnóstico de intolerância à estatina (IE) e, assim, garantir maior confiança por parte do paciente e otimização da adesão.
Dito isto, aceitamos o desafio de ajudar nossos leitores compilando o que há de melhor e mais atual sobre o assunto, da definição ao manejo da IE!
Dividiremos essa edição em 4 etapas:
1. Os possíveis efeitos adversos relacionados à estatina;
2. Efeitos adversos versus Intolerância à estatina (qual a definição?);
3. Prevalência e fatores de risco;
4. A abordagem do paciente sintomático.
Vamos lá?
Efeitos adversos das estatinas
Primeiro ponto: não confunda efeito adverso com intolerância à estatina (IE)! Devemos lembrar que as estatinas possuem efeitos adversos específicos e que a simples ocorrência de um deles não define IE! Falaremos disso mais adiante.
Sendo assim, vale a pena reforçar os efeitos adversos que devemos estar atentos:
Hepatotoxicidade:
De fato, não há ligação confirmada entre terapia com estatina e danos hepáticos, e a maioria das diretrizes atuais recomenda a análise de transaminases apenas antes do início da terapia com estatina, dosando durante o tratamento caso surjam sintomas.
🎲 A prevalência observada é menor que 1%.
Diabetes de início recente:
Aqui sim, existe uma associação. Mas não podemos deixar que ela nos engane a ponto de não prescrevermos estatina para nosso paciente.
O risco da diabetes de início recente depende da presença de alguns fatores como resistência insulínica, do número de componentes da síndrome metabólica e da duração e intensidade da terapia com estatina.
🎲 Para cada 1.000 pacientes tratados anualmente com estatina de baixa dose, ou 500 pacientes com estatina em dose moderada a alta, surge um novo caso de diabetes.
Porém, baseado nos dados de pesquisas disponíveis, os benefícios associados à terapêutica com estatinas superam em muito o risco para doentes com risco CV elevado e muito elevado (NNH > 3–5 vezes que o NNT).
Em resumo:
Aqueles em risco de desenvolver o efeito adverso (como citamos acima), devem ser orientados sobre medidas que reduzem a incidência: exercício físico, redução da ingestão calórica, perda de peso e parar de fumar (orientações universais, diga-se de passagem).
Sintomas musculares associados à estatina (SMAE)
Sem dúvida alguma, os efeitos musculares adversos das estatinas são os que mais recebem destaque e que mais contribuem para a perda de adesão terapêutica.
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