Novidades na cardiologia intervencionista
O TCT 2024, revisão sobre massas cardíacas e muito mais
Novidades do TCT 2024
Caso você ainda não conheça o TCT (Transcatheter Cardiovascular Therapeutics, ou simplesmente Congresso Americano de Cardiologia Intervencionista) já saiba que a sua relevância vai muito além das salas de hemodinâmica.
Quem mandou os hemodinamicistas “meterem a mão” em todas áreas da cardiologias? rs
Desde o universo das coronárias, passando pela válvula e até mesmo na IC, os estudos apresentados impactam significativamente a nossa prática clínica.
O tratamento da estenose aórtica (EAo):
No mundo da troca valvar aórtica percutânea (TAVI) foram apresentados estudos há muito tempo aguardados. Eles nos trouxeram respostas (ou será que foram ainda mais dúvidas) em relação a 3 importantes questões:
A troca valvar em assintomáticos:
O nome da vez foi o estudo EARLY-TAVR, que demonstrou benefício na realização da TAVI nos pacientes com EAo importante assintomáticos.
Mais interessante que o benefício na redução de desfecho composto (morte, AVC ou internações por motivo cardiovascular), foi o entendimento a respeito da evolução destes pacientes para EAo sintomática (em 6 meses 30%; 1 ano 50%; 2 anos 70%).
Ou seja, queira ou não indicar a TAVI precocemente (indicação que ainda não é contemplada nas principais diretrizes), você estará “adiando o inadiável” por pouco tempo.
Em contexto um pouco mais amplo, veio o estudo EVOLVED.
Nele, foram randomizados 224 pacientes com EAo importante assintomáticos mas com fibrose detectável à ressonância magnética para troca valvar precoce (75% por procedimento cirúrgico) ou tratamento conservador.
O estudo foi bastante afetado pela pandemia e por atrasos nos sistemas de saúde, e falhou em demonstrar benefício da intervenção precoce.
O maior número de pacientes, a maior idade e a opção pela intervenção percutânea pesaram a favor do EARLY-TAVR, em concordância com estudos prévios como AVATAR e RECOVERY (ambos cirúrgicos), favorecendo uma tendência à abordagem precoce dos pacientes com EAo grave assintomática, ou ao menos uma vigilância de perto, cientes que logo evoluirão com sintomas. A avaliação de fibrose, por sua vez, parece não afetar a indicação.
Estenose aórtica moderada e disfunção ventricular:
Mas que loucura é essa? Agora todos vão para TAVI?
Se você achou exagerado aí vai o racional do estudo: pacientes com EAo moderada e disfunção ventricular importante (é o mundo da TAVI unindo-se com o da IC rs).
Ou seja: será que “aliviar” o VE que já apresenta disfunção poderia ser benéfico?
Frustrando as expectativas, o TAVR UNLOAD não demonstrou benefício ao realizar TAVI neste cenário em redução de desfechos clínicos.
Qual a melhor prótese?
Os clássicos estudos PARTNER e COREVALVE foram os pioneiros no tratamento de TAVI, consagrando as próteses Sapien (Edwards Lifesciences) e Evolut (Medtronic). As novas próteses, portanto, sempre se colocam à prova frente a estas duas.
Foi a vez da AcurateNeo2 (Boston Scientific) que não atingiu não-inferioridade em relação às pioneiras, no estudo ACURATE IDE.
Muito deve ser discutido a respeito da parte técnica e possibilidade de otimização dos resultados a fim de atingir a equivalência em termos de resultados clínicos.
E as coronárias?
Não cuspam no prato que comeram!
A doença coronariana continua sendo uma área encantadora e alvo de muitos estudos.
Destacamos a frustração com o uso de aterectomia rotacional em angioplastias de lesões calcificadas: não houve diferença em desfechos clínicos e técnicos com o uso desta terapia em relação a angioplastia padrão!
Por outro lado, o estudo FAVOR III veio para chamar atenção e olharmos os próximos capítulos: não conseguiu comprovar não inferioridade do QFR (avaliação funcional não invasiva) em comparação com o FFR (queridinho dos hemodinamicistas para avaliação funcional). No entanto, conclui que o QFR pode ser utilizado em cenários mais carentes com indisponibilidade do FFR.
No bom e velho cenário do IAM com supradesnivelamento de ST, o estudo HELP PCI apresentou benefício no curto prazo da administração de dose plena de heparina não fracionada antes da realização do cateterismo!
Para fechar, tivemos a primeira derrota do ano para a colchicina: o estudo CLEAR SYNERGY falhou em demonstrar benefício do sue uso no cenário pós-IAM.
Vamos lembrar que na DAC estável a Colchicina mostra-se atrativa mas este trial joga água no chopp dos cholchiciners no cenário agudo.
O que mais?
Para quem nunca ligou para cateterismo direito, os hemodinamicistas até que estão bem empolgados com o possível benefício do tratamento invasivo de TEP agudo.
Foram divulgados os resultados do estudo PEERLESS, o qual demonstrou benefício da trombectomia mecânica com dispositivo FlowTriever:
Principal benefício: menor deterioração clínica e tempo de UTI e hospitalização e menor re-hospitalização em 30 dias.
Sem diferença de mortalidade, sangramento intracraniano ou sangramento maior.
Ainda do lado direito do coração, o estudo TRISCEND II demonstrou benefício na terapia percutânea da insuficiência tricúspide principalmente em melhora dos sintomas e qualidade de vida.
Acesso intraósseo na PCR
Ensaios clínicos randomizados (NEJM)
Nem só de intervenção vive a cardiologia.
Que tal discutirmos um cenário mais próximo da “vida real”? O caótico atendimento da uma parada cardiorrespiratória extra-hospitalar.
É em meio a esse “caos organizado” que surgiu a ideia: por que não facilitar o acesso vascular para infusão das drogas necessárias por meio da via intraóssea?
Foram publicados, no NEJM, 2 estudos que avaliaram essa técnica quando comparada ao acesso intravenoso habitual:
Avaliou se o acesso vascular intraósseo em comparação com o intravenoso (IV) melhora a sobrevida em 30 dias em pacientes com PCR extra-hospitalar.
Não houve diferença significativa entre os grupos (4,5% no grupo intraósseo vs. 5,1% no intravenoso). A circulação espontânea retornou mais frequentemente no grupo IV (39,1% vs. 36,0% no IO).
Comparou a eficácia do acesso intraósseo e intravenoso em relação ao retorno sustentado à circulação espontânea em adultos com PCR extra-hospitalar.
O sucesso na obtenção de acesso vascular dentro de duas tentativas foi maior no grupo intraósseo (92% vs. 80% no IV). No entanto, não houve diferenças significativas no retorno sustentado da circulação entre os grupos (30% no IO vs. 29% no IV).
Ambos os estudos não encontraram superioridade do acesso intraósseo sobre o intravenoso em termos de desfechos clínicos importantes em pacientes com PCR extra-hospitalar, desafiando a percepção de que o acesso intraósseo poderia ser mais eficaz devido à rapidez de estabelecimento em situações de emergência.
Investigação das massas
Artigo de revisão (JACC: CardioOncology)
Não há trabalho investigativo mais complexo na cardiologia que o das massas cardíacas.
Benignas ou malignas? Primárias ou secundárias?
São perguntas que irão mudar completamente a nossa conduta e o prognóstico do paciente.
Caro Sherlock, se já sabemos que a biópsia é o padrão-ouro, porém nem sempre está disponível (seja pelo risco do procedimento, pela invasividade ou por uma questão de recursos), o conhecimento da investigação pelos métodos de imagem torna-se quase essencial.
Um artigo recente do estado da arte publicado no JACC CardioOncology dá um panorama completo de como usar cada ferramenta de imagem no caminho do diagnóstico.
🛑 But, first…
Se você quer uma revisão completa com base nesse artigo sobre o estudo das massas, saiba que esse será o tema da DozeNews Prime do dia 13/11!
Já vamos conhecer as ferramentas propostas na revisão:
Para um início de conversa, a ecocardiografia é nossa porta de entrada – é prática e, em muitos casos, suficiente para um primeiro olhar.
No entanto, a ressonância magnética cardíaca (RMC) se firma como o “padrão-ouro” não invasivo, entregando detalhes ricos sobre a composição dos tecidos.
A tomografia computadorizada e a tomografia por emissão de pósitrons (PET) entram como aliadas para completar o quebra-cabeça, especialmente quando há sinais de malignidade.
Mas aí vai a dica de ouro: atenção aos “red flags” – como margens irregulares e invasão de tecidos adjacentes. Esses indicadores ajudam a diferenciar entre maligno e benigno e nos guiam nas próximas etapas.
O artigo reforça ainda que, além de técnica, temos que ser estratégicos. Um protocolo bem definido de imagem multimodal reduz atrasos e evita exames desnecessários, tornando o diagnóstico mais rápido e menos custoso.
As novas tecnologias, como a ecocardiografia 3D e os mapas paramétricos da RMC, nos permitem detalhar melhor a massa e identificar impactos hemodinâmicos.
Imagem da Semana
Reconstrução em 3D de angiotomografia do coração com importante calcificação na valva mitral em paciente com troca valvar aórtica prévia.
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👩🍼 O que todo cardiologista deve saber sobre cardiopatias congênitas (e não é sensacionalismo do editor, este é o título do artigo!).
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