Quem brilhou em 2023
Principais trials do ano
Muitos brilharam em 2023, mas na cardiologia o centro de todos os holofotes teve 01 nome: agonistas da GLP-1.
Vibramos tanto com a publicação dos trials SELECT e STEP-HFpEF, que tornaram realidade o papel dos agonistas da GLP-1 como aliados no tratamento cardiovascular, quanto com os títulos de Rebecca Andrade na ginástica artística.
Enquanto o SELECT demonstrou a redução de desfechos cardiovasculares em pacientes com sobrepeso ou obesidade não-diabéticos em uso da semaglutida, o STEP-HFpEF comprovou os seus bons resultados no tratamento da IC FEP.
Ambos com a mesma direção: o benefício da perda ponderal na redução de eventos cardíacos.
No ano em que discursos polêmicos e ultraliberais de Javier Milei o levaram à presidência argentina, no campo das coronariopatias fomos muito mais conservadores: reafirmamos a importância do tratamento percutâneo para melhora angina no ORBITA 2, e também do uso da imagem intracoronária na angioplastia de lesões complexas no RENOVATE-COMPLEX PCI (ainda sem solucionar a questão da viabilidade em relação aos custos).
Vimos, ainda, estourar os conflitos entre Israel e o Hamas no Oriente Médio, enquanto na cardiologia uma união funcionou: a eletrofisiologia e o tratamento da IC. O estudo CASTLE-HTx demonstrou grande benefício da ablação da FA em pacientes com IC avançada.
Destaque, ainda, para os estudos MULTISTARS-AMI que demonstrou não-inferioridade das lesões não culpadas no momento index no IAMcSST; e o LODESTAR que não mostrou diferença no uso da rosuvastatina ou atorvastatina em pacientes com DAC estável.
Manda quem pode
As principais diretrizes de 2023
Taylor Swift e Beyoncé com suas turnês bilionárias? Pep Guardiola no comando do Manchester City campeão de forma inédita da UCL e do mundial de clubes? As táticas do dinizismo que deram o que falar?
Não faltaram nomes candidatos a big boss de 2023.
Já na cardiologia nossas condutas foram atualizadas em pelo menos 10 grandes novas diretrizes. Ler e estudar todas não é uma missão fácil e por isso a Doze abraçou a missão de te ajudar durante o ano.
Brasil 🇧🇷
A Sociedade Brasileira de Cardiologia publicou 03 diretrizes novas em 2023:
❤️🔥 Diretriz da SBC sobre Diagnóstico e Tratamento de Pacientes com Cardiomiopatia da Doença de Chagas
Em conjunto com a Sociedade Brasileira de Medicina Tropical, a extensa diretriz teve como foco apenas as alterações cardiovasculares do Chagas.
Com a versão pré-print na internet desde final de 2022, a diretriz foi publicada no começo desse ano.
A diretriz disseca desde epidemiologia e fisiopatologia até diagnóstico, estratificação e tratamento.
💾 Diretriz Brasileira de Dispositivos Cardíacos Eletrônicos Implantáveis
Já em Janeiro de 2023 a SBC chegou com essa novidade. E para quem achou que o conteúdo seria exclusivo para arritmologistas e afins, se enganou.
O conteúdo da diretriz despencou na prova do Título de Especialista em Cardiologia (TEC) de 2023. Ops.
A diretriz é muito bem escrita e aprofundada em diversas sessões:
Marca-Passo (MP) convencional e suas programações
Terapia de ressincronização cardíaca (TRC)
Cardiodesfibrilador Implantável (CDI)
Além disso, finaliza com recomendações quanto à monitorização dos dispositivos, realização de procedimentos e exames como ressonância magnética, além da prevenção e tratamento das infecções (realizamos até uma edição da Prime desta sessão).
👰🏽♀️ Posicionamento sobre a Doença Isquêmica na Mulher
Diante do reconhecimento da sub-representação feminina nos principais trials e revisões da Cardiologia, e com o crescente estudo das peculiaridades da doença isquêmica na mulher, a SBC publicou esse interessante posicionamento sobre este tema.
Pontos de destaque:
Propensão de mulheres à sintomas atípicos;
Maior prevalência mecanismos não-obstrutivos (vasoespasmo, disfunção microvascular, embolia/trombose) do que nos homens.
As diferenças de cada exame diagnóstico:
o teste ergométrico tem menor sensibilidade nessa população;
a cintilografia miocárdica pode apresentar falsos positivos decorrentes de atenuação mamária e tem menor acurácia em corações pequenos.
Norte-americanos 🇺🇸
Com um primeiro semestre mais fraco, a AHA, em conjunto com a ACC, publicou 2 diretrizes de grande impacto no final de 2023.
⚡ Diretriz de diagnóstico e manejo de fibrilação atrial (FA).
Um documento completo com destaque para uma nova classificação de FA em estágios, risco tromboembólico além do CHA2DS2-VASc, novas recomendações de controle precoce de ritmo e o papel da ablação.
🧨 Diretriz de Doença Arterial Coronária Crônica (DAC)
São 123 páginas de DAC, com tudo do diagnóstico, escolha do exame de estratificação (o tema é tão extenso que só de DozeCast já foram 3 episódios, rs), tratamento medicamentoso e interveção.
Europeus 🇪🇺
Foram 5 diretrizes novas, entre atualizações e diretrizes únicas, publicadas durante o famoso congresso europeu (ESC).
🚨 Diretriz de síndrome coronariana aguda: englobando Supra e Sem Supra em um documento só. Uma diretriz que merece ser lida por inteira.
🦠 Diretriz de endocardite: 8 anos após a última, a diretriz de endocardite está muito bem feita e esclarecendo dúvidas que surgiram com as evidências dos últimos anos (como a possibilidade de término de ATB por via oral).
Os assinantes da DozePrime já pegaram o principal da diretriz em duas edições, uma do diagnóstico e outra do tratamento da endocardite.
❤️🩹 Atualização da diretriz de insuficiência cardíaca: mesmo com a diretriz recente em 2021, diversos estudos surgiram nesses últimos 2 anos e atualizaram o manejo da IC. Destaque para a Finerenona e suplementação de ferro EV que aumentaram seus graus de recomendação.
🧬 Diretriz de cardiomiopatias: pela primeira vez estamos diante de uma diretriz exclusiva do tema. Excelente para estudo e consultas. Discute uma abordagem baseada nos diferentes fenótipos das cardiomiopatias: hipertróficas, dilatadas, arritmogênicas, restritivas…
🧁 Diretriz do manejo da doença cardiovascular no diabetes: atualizações do manejo desse perfil específico de pacientes, com destaque para a recomendação de uma nova calculadora de risco no paciente diabético - a SCORE2-Diabetes.
É polêmica que você quer?
Os artigos que deram o que falar em 2023
O que seria da cardiologia sem um pouco de polêmica, não é mesmo?
No ano em que a prescrição e o uso do suco 🧃 tornou-se rotina para muitos e os fake natties viraram uma realidade cada vez mais comum, o NEJM publicou um estudo que demonstrou a segurança cardiovascular da terapia de reposição de testosterona em homens de meia-idade e idosos com hipogonadismo.
Infelizmente diversos prescritores por aí vão optar por ignorar a população e o ensaio clínico estudados para defender o uso indiscriminado dessa reposição…
Mais quente que as temperaturas em 2023, só mesmo as discussões quando o tema é viabilidade miocárdica. Foi publicada no JAMA a subanálise do estudo REVIVED, no qual a presença de miocárdio viável não associou-se a melhor recuperação da função ventricular após angioplastia em pacientes com IC FER.
A briga da vez ficou por conta da arritmologia: devemos ou não anticoagular na FA subclínica?
Os estudos ARTESIA e NOAH-AFNET foram conduzidos para investigar o benefício da anticoagulação da FA subclínica (duração de 6 minutos - 24 horas). Enquanto o primeiro demonstrou benefício da apixabana na prevenção de embolia sistêmica (à custa de aumento do sangramento), o segundo foi interrompido em 21 meses pelo excesso de sangramento no grupo da edoxabana.
Parece que estamos tão perto de solucionar a questão da anticoagulação da FA subclínica quanto do fim da guerra na Ucrânia.
Em um futuro não tão distante
As novas terapias
Não podemos falar de 2023 sem lembrar dela: a inteligência artificial (IA)
Responsável por fazer os atores de Hollywood colocarem o looking revolucionário e irem às ruas pedindo sua regulamentação, e por dar voz aos Beatles em nova música, a IA também não passou despercebida na cardiologia.
O ano foi marcado pelo boom de artigos que nos apresentaram as mais diversas formas de uso da IA - seja para auxiliar na prescrição de medicações (como o BETTER CARE-HF e o PCDS Statin), para orientar a vacinação (NUDGE-FLU) ou até no rastreio cardiovascular em tomografias de tórax.
Além disso, presenciamos os primeiros passos de novas terapias que podem fazer parte do nosso dia a dia no futuro:
Os inibidores do fator XI: se no AZALEA-TIMI 71 o abelacimab aplicado mensalmente de forma subcutânea reduziu sangramento em pacientes com FA quando comparados aos DOACs; o OCEANIC-AF precisou ser interrompido precocemente por piores desfechos do asundexian.
No mundo das dislipidemias, o acido bempedoico surge como boa opção às estatinas em pacientes intolerantes, no CLEAR trial.
Já na intervenção, finalmente começamos a lembrar da “valva esquecida”: o estudo TRILUMINATE trouxe bons resultados com a intervenção percutânea da valva tricúspide com o TriClip.
A cardiologia na boca do povo
Caiu na mídia
De reportagem no Fantástico a coluna de fofoca do Léo Dias, a cardiologia esteve na boca do povo em 2023.
O que teve de parente seu que saiba mais de insuficiência cardíaca que você após o transplante de coração de Faustão, não foi? rs
Ainda no mundo dos transplantes, presenciamos a morte do segundo receptor do coração do xenotransplante cardíaco de porco.
Em 2023, vimos o número de pacientes obesos atingir o seu ápice: são mais de 1 bilhão atualmente, e as previsões chegam a 4 bilhões em 2035 (mais da metade da população mundial).
Enquanto isso, descobrimos que para prevenir eventos cardiovasculares precisamos subir pelo menos 50 degraus por dia, ter o menor tempo possível de atividade sedentárias, comer menos ultraprocessados e caminhar pelo 7126 passos por dia. Conte-nos a novidade, quero ver fazer rs.
Finalizamos o ano reforçando a importância da cardiologia: no apagar das luzes de 2023, o o jornalista da TV Globo, José Roberto Burnier, sofreu um infarto que foi prontamente diagnosticado e tratado.